O atendimento a pessoas LGBTI+ no Ceará deve ser qualificado tanto em órgão municipais como estaduais de assistência social deve ser qualificado, a partir deste ano. Uma resolução entre os Conselhos Nacionais da Assistência Social (CNAS) e de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (CNCD/LGBT) estabeleceu parâmetros a serem adotados para garantir o acesso digno dessa população a serviços públicos, como permissão do uso de banheiros de acordo com a identidade de gênero e a inserção de campos de identificação para nome social e orientação sexual nos cadastros e prontuários.
Dentre as medidas listadas pela resolução conjunta nº1, publicada no Diário Oficial da União do último 24 de setembro, estão o reconhecimento das famílias compostas por membros LGBTI+, sejam os laços formalizados ou não; a divulgação de campanhas de combate à discriminação; a promoção de debates e seminários que discutam as demandas; a capacitação dos profissionais; a realização de pesquisas e diagnósticos sobre esse público; e a elaboração de metodologias de atendimento.
Conforme a diretora de Promoção dos Direitos LGBT do Ministério dos Direitos Humanos (MDH), Marina Reidel, a demanda de padronização dos processos partiu, além dos usuários, dos próprios serviços, “que não estavam conseguindo dar conta das especificidades do público” – e, segundo Marina, representa um salto na conquista de direitos das pessoas LGBT.
Orientação
“A normas serão válidas para todo e qualquer tipo de atendimento do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Hoje, o CadÚnico, por exemplo, não possui os campos de nome social, identidade de gênero e orientação sexual. Isso é uma dificuldade, porque ele é a porta de entrada para os programas sociais. Se as pessoas não são respeitadas no início, como acessar o sistema todo?”, reflete Marina.
A coordenadora de Assistência Social de Fortaleza, Silvana Garcia, garante que “trabalhar a questão de gênero é muito tranquilo para o Município, porque nos Cras, Creas, Centros POPs e demais equipamentos os profissionais já são preparados para lidar com a temática”, mas reconhece como desafio que “alguns equipamentos não têm capacidade para atender esse público”, devendo passar por reformas.
Para Marina Reidel, a resolução compreende os serviços sociais, mas abre precedente para expandir os direitos a outras áreas. “Temos discutido as demandas das pessoas LGBT com os ministérios da Saúde, Educação e Segurança Pública. É questão de cultura. Não adianta criar uma lei e lá na ponta o serviço não estar sendo cumprido”.
Demanda
A expansão, aliás, é urgente para que situações como a enfrentada pela cuidadora de idosos A.F., 23 anos, cessem. “Passei por constrangimento no banheiro de uma faculdade pública, quando uma guarda chamou minha atenção por estar no banheiro feminino. Foi horrível, mas rebati. Ainda há despreparo de profissionais para atender a população trans e entender seus direitos, mas acredito que o avanço nas políticas públicas ajude nesse reconhecimento”, declara A.F., cuja transição de gênero iniciou há cerca de dois anos.
Para o antropólogo e presidente da Associação Transmasculina do Ceará (Atrans/CE), Kaio Lemos, as questões práticas do atendimento socioassistencial, como respeito ao nome e à identidade de gênero, são fundamentais – mas a demanda da população de lésbicas, bissexuais, transexuais e travestis é ainda mais profunda. “A maioria dos profissionais não entendem o que ocorre principalmente com as pessoas trans. O que a gente espera de um serviço social? Não só ouvidoria e coleta de dados, mas que o processo ocorra em totalidade. Que a partir das nossas demandas, sejam elaborados projetos de combate à violência diária, que haja um retorno”, critica.