Um fruto amazônico amplamente utilizado como remédio caseiro pelas populações ribeirinhas da região pode ser a chave para ajudar a baratear e simplificar o tratamento da leishmaniose, doença que provoca ulcerações na pele e que atinge cerca de 3 mil pessoas ao ano no Brasil.
Um grupo de pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) testa um creme fitoterápico à base do jucá (Libidibia ferrea) como terapia alternativa às dolorosas injeções do tratamento contra a leishmaniose do tipo tegumentar (LT).
Os testes iniciais com o creme, em roedores, foram animadores. Segundo os pesquisadores, os animais tratados com o preparado à base do jucá tiveram 25% de crescimento de lesões relacionadas à doença, em comparação ao aumento de 300% dos animais que não receberam nenhum tratamento.
O estudo, que começou no Laboratório de Leishmaniose e Doenças de Chagas do Inpa, tem o objetivo de desenvolver um medicamento eficaz, de uso tópico e com uma logística de distribuição simplificada para auxiliar os pacientes que moram em áreas de difícil acesso.
A ideia é que o creme feito com a planta possa ser associado à medicação recomendada pelo Ministério da Saúde e usada há mais de 50 anos, o glucantime, para agir como coadjuvante no tratamento da leishmaniose tegumentar.
O jucá, também conhecido como pau-ferro, é um velho conhecido dos ribeirinhos da região amazônica, muito utilizado por eles em forma de chá como remédio caseiro para diversas enfermidades.


Árvore nativa do Brasil, ele está amplamente presente nas regiões Norte e Nordeste. Tem propriedades antissépticas, antienvelhecimento, antioxidantes e antipigmentação. Também é usado como adstringente, antidiarreico, cicatrizante, sedativo, tônico, anti-inflamatório, expectorante e até mesmo afrodisíaco.
Bons resultados
.De acordo com o farmacêutico responsável pela pesquisa, Bruno Jensen, o experimento ainda está restrito a roedores – mas com resultados satisfatórios.
O grupo de animais que não recebeu tratamento apresentou evolução clínica das lesões cutâneas de 300% (aquelas que dão origem às primeiras infecções). Já no grupo de controle, que recebeu tratamento das lesões com a formulação farmacêutica incorporada com a fração de uma substância encontrada no jucá, o diclorometano, foi observado crescimento de apenas 25% das lesões.
Já na comparação entre dois grupos que receberam tratamentos diferentes, um com a micro emulsão (o creme fitoterápico) e o outro com o glucantime (a medicação preconizada pelo Ministério da Saúde como primeira escolha para o tratamento da leishmaniose), não houve diferença estatística quanto à evolução das lesões.
O desempenho, para Jensen, mostra que o tratamento da leishmaniose poderia ser complementado com o creme, aumentando sua eficácia e reduzindo os efeitos colaterais apresentados a partir da administração da medicação única indicada pelo governo.
Para a líder do grupo de pesquisa do Inpa, Antônia Maria Ramos Franco, o desenvolvimento de novos fármacos é importante para um país que necessita reduzir as despesas com o tratamento de uma doença considerada negligenciada – aquelas causadas por agentes infecciosos ou parasitas e que afetam principalmente as pessoas de menor poder aquisitivo.
“Somos especialistas na realização de pesquisas científicas envolvendo este tipo de enfermidade, que é considerada um grande problema mundial, não só no Brasil”, diz Franco. “Agora, estamos iniciando uma nova etapa, a busca por parceiros que tenham interesse em produzir esse fitoterápico à base de jucá em escala industrial.”
Há outros tratamentos alternativos para combater os efeitos colaterais associados ao tratamento da leishmaniose tegumentar, como a pomada à base de própolis vermelha e o extrato do vegetal, conhecido como saião (Kalanchoe pinnata).
A pesquisa
Durante um ano de experimentação (2016/2017), a pesquisa foi tema do mestrado de Jensen. O grupo de pesquisa do Laboratório de Leishmaniose e Doenças de Chagas/Inpa vem investigando os estudos de frações da árvore do jucá que já tinham apresentado bons resultados. Agora, ele dá sequência à pesquisa no doutorado em Inovação Farmacêutica da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), com orientação de Franco.
Segundo Jensen, a pesquisa ainda não foi publicada em revista científica porque o estudo precisa aguardar o pedido de patente, que, de acordo com o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi), deve cumprir com o prazo estabelecido em Lei.
“Como a pesquisa é recente e o processo de patente geralmente leva de 18 a 36 meses para ser finalizado, ainda não podemos publicá-la”, diz o pesquisador.