sábado, 12 de outubro de 2024

XV Encontro Mestres do Mundo conclui edição 2023 com entrega de títulos de Notório Saber em Cultura Popular e propostas para o futuro dos Tesouros Vivos

Quatro dias de ricas trocas. Uma jornada única, na qual o público desbravou e conectou-se com os inúmeros fazeres e saberes ancestrais da cultura cearense. O domingo (10) demarcou o encerramento do XV Encontro Mestres do Mundo, contudo, os ensinamentos dos guardiões e guardiãs da tradição popular seguem ecoando e ofertando coordenadas para o futuro.

Realizado pelo Governo do Ceará, por meio da Secretaria da Cultura (Secult Ceará) e do Centro Cultural do Cariri Sérvulo Esmeraldo, em parceria com o Instituto Mirante de Cultura e Arte, esta edição celebrou 20 anos da política dos Tesouros Vivos do Ceará. Território para os conhecimentos e encantos que emanam dos mestres e mestras de nossa cultura.

Seminários, rodas de conversa, lançamento de livro, debates, aulas espetáculo, exposição, gastronomia popular, oficinas, feiras de artesanato, programação musical, atividades externas e uma diversa rede de atrações consolidou este caldeirão de vivências. 72 mestres e mestras,12 grupos e três coletividades confirmadas. Um só caminho, a salvaguarda de nosso patrimônio imaterial.

E o dia de encerramento fez jus ao conjunto cultural testemunhado e festejado desde o primeiro momento do Encontro. A emoção tomou conta do Centro Cultural Cariri durante a cerimônia de entrega do título de Notório Saber em Cultura Popular para 25 Tesouros Vivos.

Doutores do saber

São lideranças reconhecidas em áreas diversas de expressão, como literatura de cordel, teatro de bonecos, cultura indígena, artesanato, música, dança, xilogravura, cultura afro-brasileira, arte circense, dentre outras. De várias regiões do estado, foram titulados mestres e mestras que expressam e materializam o saber do povo.

A titulação contou com a participação da secretaria da Cultura do Ceará, Luisa Cela; a secretária executiva de Planejamento e Gestão Interna da Cultura do Ceará, Gecíola Fonseca; o reitor da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Hidelbrando dos Santos Soares; a Pró-Reitora de Extensão da Uece, Maria Anezilany Gomes do Nascimento; o secretário de Formação, Livro e Leitura do Ministério da Cultura (MinC), Fabiano Piúba; diretor do Instituto Mirante de Cultura e Arte, Tiago Santana; a gestora do Centro Cultural do Cariri, Rosely Nakagawa; a vice-reitora da Universidade Regional do Cariri, Socorro Vieira e o Chefe de Gabinete da Reitoria da Uece, Altemar da Costa Muniz.

“É uma ação de reconhecimento, mas é fundamentalmente uma ação de reparação com que a história colonial do nosso país fez com os saberes e fazeres tradicionais do povo negro, do povo indígena, e que esse momento reconhece e concede uma titulação que reconhece esses saberes tão importantes quanto ou até mais do que o saber acadêmico. Então, é muito emocionante ver cada um de vocês receber aqui esse diploma”, destacou a secretária Luisa Cela.

Cada mestre e mestra titulada recebeu aplausos da plateia, simbolizando todo o carinho e reverência do público para com os Tesouros Vivos. “A representatividade dessa certificação é traduzida em muitas alegrias, falas e sorrisos. Isso aqui é trazer de volta para nossas casas uma parte da construção da vida, uma parte de escolha de nossas vidas em dedicar a nossas comunidades o que acreditamos e fazemos. Estamos aqui porque acreditamos”, ressaltou a Mestra Carla Mara (Fortaleza).

Para o Reitor da Uece, Hidelbrando dos Santos Soares, estão ali os guardiões e guardiãs da cultura popular, patrimônio cultural do Ceará e do povo cearense. “Neste ato, a Universidade Estadual do Ceará reconhece que esses tesouros vivos dedicaram e dedicam suas vidas à aquisição, constituição e a transmissão de conhecimentos tradicionais de relevância social e coletiva para suas comunidades, mas também para o Ceará, para o Brasil e para o mundo”, compartilhou.

“É o momento no qual a Universidade Estadual do Ceará assume a necessidade histórica de reconhecer epistemes não eurocêntricas. E o tanto que isso contribui para nós enfrentarmos a dupla face de um racismo constitutivo, aquele que se faz presente na sociedade e que muitas e muitos dos que estão aqui presentes sentem na pele todos os dias”, contextualizou a Pró-Reitora de Extensão da UECE, Maria Anezilany Gomes do Nascimento.

Já o Mestre Pádua de Queiroz agradeceu a titulação unindo poesia e inspiração. “Nós somos Tesouros Vivos, e temos como missão, manter sempre acesa a chama dessa nossa tradição. E a Secult no Brasil foi pioneira, empunhando a bandeira dessa nossa tradição. Salvaguardando os nossos tesouros vivos, hoje temos mais motivos para tamanha gratidão”, declamou Mestre Raimundo Claudino.

Momento de escuta

Antes da cerimônia de Notório Saber com os 25 mestres titulados, uma plenária geral foi realizada. Pensado como momento de escuta, fluxo de propostas e troca de ideias, esta ação consolidou observações e reflexões acerca do evento, bem como futuras ações voltadas aos Tesouros Vivos e novas edições do Encontro Mestres do Mundo.

Um bate-papo para mergulhar nas questões que envolvem mestres e mestras da cultura, grupos e coletividades. O diálogo possibilita a costura de intervenções pensadas em seus anseios, dúvidas e reivindicações. A rodada de diálogo teve participações da secretária Luisa Cela, a coordenadora de Patrimônio Cultural e Memória (Copam), Jessica Ohara, a secretária executiva de Planejamento e Gestão Interna da Cultura do Ceará, Gecíola Fonseca e a Mestra Carla Mara.
Dentre os mestres que partilharam do debate estavam Mestre Klevisson Viana, Mestre Gilberto Calungueiro, Mestre Galdino, Mestra Mãe Zimá, Mestre Zé Carneiro, Mestre Aldenir, Mestre Pajé Luís Caboclo, Mestre Cacique João Venâncio, Mestre Raimundo Claudino, Mestre Pai Neto Tranca Rua, Mestre Cirio Brasil, Mestra Zulene, Mestre Moisés e Mestre Rainha Almeida

Questões logísticas do evento, diálogo da Secult Ceará com gestores municipais e reconfiguração de editais foram algumas das observações levantadas. A plenária também identificou elogios à condução do Encontro e da política de Tesouros Vivos.

“Vamos dialogar a partir da carta que sistematiza todos os pontos discutidos com vocês. Tanto da avaliação deste encontro como também da avaliação da própria política e do que vocês apresentam como pontos prioritários. Meu compromisso é com o diálogo aberto, permanente, verdadeiro. Aquilo que é possível de forma rápida, resolvemos.
Aquilo que demorar um pouco mais de tempo, vamos precisar articular e mobilizar em outros lugares para conseguir tornar realidade”, asseverou a secretária Luisa Cela.

Sob as bênçãos da Chapada do Araripe

Após este mergulho em duas importantes atividades do domingo, é hora de passear sobre outros destaques que escreveram a história do domingo de XV Encontro Mestres do Mundo.

Às 9h, a Vila da Música Monsenhor Ágio Augusto Moreira, que integra a Rece, realizou a segunda edição do “Concertos para a Chapada”. A ocasião foi única, pois especialmente integrou a programação do XV Encontro Mestres do Mundo. Em meio às riquezas naturais da Chapada do Araripe, no bairro Belmonte, Crato, o público acompanhou apresentações de Mestre Macaúba e Orquestra Solibel Jovem.

A recepção do concerto foi garantida por Mestre Galdino. “Um concerto para a floresta é muito bem-vindo. A floresta precisa de música. Precisa ser cuidada e preservada. É isto que ela precisa. E quem ganha com tudo isso é a floresta e o povo que mora em torno dela. Com certeza, com uma festa dessa, o pessoal terá mais olhar para a floresta, para a mãe natureza”, contou o mestre mateiro, mezinheiro, escultor e Tesouro Vivo do Ceará.

Com o projeto “Concertos para a Chapada”, a Vila da Música está promovendo uma série de concertos instrumentais, aos domingos, com apresentações de seus grupos artísticos e de convidados, com vista para a Chapada do Araripe, no bairro Belmonte, Crato – Ceará.

A partir desta reflexão, o palco foi cenário de um dos maiores nomes do bandolim no Brasil. Mestre Macaúba desfilou uma série de sucessos da música instrumental e temas autorais, como a clássica “De pai pra filho” (Valter Pereira/Mestre Macaúba). Em meio à apresentação, o mestre reverenciou aquele que iniciou o sonho que hoje é a Vila da Música.

“Essa música agora se chama ‘Pedacinho do Céu’. Eu quero oferecer ao nosso Padre Ágio. Queria uma salva de palmas para onde ele estiver. Fundador dessa escolha maravilhosa, que tanto gera música e coisa boa. Parabéns, Padre Ágio. Escute essa música para o senhor”, compartilhou Mestre Macaúba.

Em seguida, a Orquestra Solibel Jovem, grupo artístico da Vila da Música Monsenhor Ágio Augusto Moreira, realizou o show “Sertão Jazz”, no qual contemplou sucessos atemporais do Jazz mundial e da música nordestina brasileiro. Um momento musical de muita beleza, sofisticação e diversidade.

“O ‘Concertos para a Chapada’ promove a necessidade de criar e fortalecer a cena da música instrumental. Nós temos nove grupos artísticos, entre eles, cinco orquestras. A grande ideia é que reunamos aos domingos um grupo e um convidado. Com esse desejo de fortalecer a cena do turismo e as questões que envolvem o meio ambiente”, explica a gestora executiva da Vila da Música, Lucinha Rodrigues.

Festa para um até logo

Pela manhã, o “Percursos da Tradição” visitou os museus Casa Mestra Zulene e Casa Mestre Raimundo Aniceto. Dando continuidade ao seu processo de integrar os muitos mundos que formam estes mestres, a Roda de Saberes trouxe duas sessões durante o dia de encerramento.

Em “Corpo: O fazer brincante”, o Terreiro da Mestra Edite acolheu os ensinamentos de Mestre Aldenir (Crato-CE), Mestre Antônio (Juazeiro do Norte-CE), Mestre Antônio Luiz (Potengi-CE), Mestre Zé Pio (Fortaleza-CE), Mestre Chico (Limoeiro do Norte-CE), Mestre Cirilo (Crato-CE), Mestra Zulene (Crato-CE), Mestra Mariinha da Ló (Paracuru-CE), Mestra Dona Mazé (Caucaia-CE), Mestre Moisés (Trairi-CE), Mestre Hugo (Aracati-CE), Mestra Maria de Tiê (Porteiras-CE), Mestra Dona Edite do Coco (Crato-CE), Mestra Lourdes do Coco (Solonópole-CE), Mestra Carla Mara (Fortaleza-CE), Mestre Lula (Fortaleza-CE), Mestre Wlisses (Fortaleza-CE), Mestre Dodô (Juazeiro do Norte-CE) , Mestre Raimundo Claudino (Tabuleiro do Norte-CE), Mestre Chico Ceará (Barbalha-CE), Mestre Nena (Juazeiro do Norte-CE) e Mestre Rainha Almeida (Maracanaú-CE).

Com “Sons: A reza na dança”, foi vez de ouvirmos as experiências de Mestre Totonho (Mauriti-CE), Mestre Antônio Pinto (Aurora-CE), Mestre Aécio de Zaira (Crato-CE), Mestre Gil Chagas / Gil D’aurora (Aurora-CE), Mestre Expedito Caboco (Juazeiro do Norte-CE), Mestre Macaúba (Caucaia-CE), Mestra Ana da Rabeca (Umari-CE), Mestre Cícero (Missão Velha-CE), Mestre Lucas Evangelista (Crateús-CE) e Mestre Geraldo Amâncio (Fortaleza-CE).

Domingo também deu continuidade aos encontros que geram aprendizado. A oficina “Xilogravura” trouxe a habilidade de Mestre Stênio Diniz e Mestre Francorli, ambos originados da tradição de Juazeiro do Norte.

Já a oficina “Tinturas naturais: caminho da cura e da magia” foi conduzida pela sapiência de Mestra Edite Dias (Dança do Coco, Meizinheira/Crato-CE), Mestra Raimunda (Dança do Coco/Meizinheira/Crato-CE) e Mestra Mãe Zimá. Selando esta importante atividade de trocas, Mestre Vamirez (Senador Pompeu-CE) dividiu toda sua experiência como santeiro durante a formação “Artesanato em arte Sacra”.

O “Seminário Interdisciplinar de Patrimônio Imaterial: 20 anos de Futuro” trouxe a última mesa do Encontro Mestres do Mundo. O tema “AGORA” – O futuro dos Tesouros Vivos é hoje” reuniu a Secretária de Cultura do Ceará, Luisa Cela, Tião Soares (Ministério da Cultura – MInC), Renato Roseno (Deputado Estadual-PSOL/Comissão de Cultura e Esporte da ALECE) e Igor de Menezes Soares (IPHAN/Ceará).

Adentrando o final da tarde, o Parque que integra o Centro Cultural Cariri foi ocupado por uma grande roda de capoeira. Outro destaque aconteceu na movimentada e elogiada Cozinha Rita e Zenilda, montada pelo equipamento cultural da RECE, Mercado AlimentaCE). Duas aulas-show trouxeram os temas “Torta de Caju”, com a confeiteira Monalisa de Figueiredo e “Baião de Todos”, com Marina Araújo, chef e diretora do Mercado AlimentaCE.

Encerrando a programação artística, o palco localizado no Terreiro das Artes, foi tomado pela sonoridade única de Maneiro Pau – Mestre Chiquinho Caboco (Crato-CE), Reisado São Francisco (Juazeiro do Norte-CE), Maracatu Vozes da África (Fortaleza-CE) e show da pernambucana Lia de Itamaracá. Assim, público, guardiões e guardiãs do saber tradicional se despediram do XV Encontro Mestres do Mundo.

Lista dos mestres e mestras tituladas com Notório Saber em Cultura Popular

Mestre Raimundo Claudino (Tabuleiro do Norte)
Mestre Chico Ceará (Barbalha)
Mestre Círio Brasil (Fortaleza)
Mestra Zilda Torres (Itapipoca)
Mestre Vamirez (Senador Pompeu)
Mestra Lourdes do Coco (Solonoples)
Mestra Dadá Leitão (Quixeramobim)
Mestre Nena (Juazeiro do Norte)
Mestre Pajé Barbosa – Em memória (Pacatuba)
Mestra Maria Isabel (Juazeiro do Norte)
Mestre Edson (Russas)
Mestra Carla (Fortaleza)
Mestre Dodô (Juazeiro do Norte)
Mestre Galdino (Crato)
Mestra Fanca (Juazeiro do Norte)
Mestra Ana da Rabeca (Umari)
Mestre Ulisses (Fortaleza)
Mestre Pai Neto Tranca Rua (Fortaleza)
Mestre Lula (Fortaleza)
Mestra Josenir (Crato)
Mestre Cícero (Missão Velha)
Mestre Klevisson Viana (Quixeramobim)
Mestre Augusto Bonequeiro (Fortaleza)
Mestre Francorli (Juazeiro do Norte)
Mestre Pádua de Queiroz (Baturité)

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