domingo, 28 de abril de 2024

Coluna política: A crise do PDT e os enigmas da política

A crise no PDT do Ceará, emblemática pela disputa entre os irmãos Ferreira Gomes, não é uma novidade política nem uma peculiaridade do caso cearense. Olhando para a história das disputas e acomodações do jogo do poder, como bem orientou Maquiavel, o que se percebe é pouca inovação nas engrenagens da máquina que move a política, havendo muita repetição dos fatos, apenas com cenários e personagens diferentes.

No caso atual do cenário político do Cerará, mais especificamente da crise que ameaça o rompimento definitivo da exitosa aliança PDT-PT e, mais recentemente, o rompimento das estruturas internas do próprio PDT cearense, há uma enorme semelhança com um cenário bem recente na história de um vizinho, digo, do Estado de Pernambuco.

Tudo que se passou e que se passa no Ceará é muito parecido com o que se deu em Pernambuco, envolvendo uma também exitosa aliança, lá protagonizada pelo PT e PSB, que se desenhou a partir da vitória na disputa pela prefeitura do Recife do então líder sindical e hoje deputado estadual João Paulo, sendo reeleito em 2004 e elegendo o seu sucessor, João da Costa, em 2008.

Nesse contexto, o PT mantinha a hegemonia política na capital pernambucana há 12, com dois governos consecutivos de João Paulo e um de João da Costa, que se lançara a reeleição para um segundo mandato (e, consequentemente, 4o do PT). A aliança com o PSB do governador Eduardo Campos estava mantida e garantido o apoio do Palácio do Campo das Princesas ao candidato petista, o que tornava bastante provável o sucesso eleitoral do robusto palanque no Recife e a manutenção da hegemonia do Partido dos Trabalhadores na matriz estadual junto com o PSB.

Contudo, João da Consta não era o candidato prioritário dos fiadores da aliança no palanque petista, mas, mesmo assim, venceu as prévias e legitimou a sua candidatura à reeleição. A cúpula do partido interveio e retirou a candidatura de Costa, criando incertezas relacionadas aos rumos da aliança. Diante do cenário, o governador Eduardo Campos rompeu a aliança e lançou um candidato próprio do PSB, o tecnocrata Geraldo Júlio, que mesmo com pouca projeção na política, venceu as eleições no 1o turno. O PT ficou em 3o lugar na disputa, e passados mais de 10 anos não conseguiu recuperar a hegemonia política na Capital nem no Estado, hoje governado pela tucana Raquel Lyra, que derrotou os candidatos do PT e do PSB.

Sobre esse particular é sempre importante apontar que, dentro do campo das probabilidades, quando há rompimento turbulento de alianças a tendência é que surjam novos arranjos partidários e, consequentemente, o surgimento de novas forças concomitantemente ao ostracismo de outras.

Mesmo que as siglas partidárias não sejam exatamente as mesmas e as relações não sigam a mesma ordem, os fatos são os mesmos, tendo como estopim a disputa pela cabeça da candidatura do PDT ao governo do Estado, quando a então governadora Izolda Cela, em seu 1o mandato, arguiu o direito de postular a sua reeleição, com apoio do ex-governador e seu aliado Camilo Santana e do senador Cid Gomes, o que garantiria a manutenção da aliança PDT-PT no Estado. Contudo, no turbilhão de disputas internas do partido, Izolda teve a negativa da legenda, que optou por outro candidato, o ex-prefeito de Fortaleza Roberto Cláudio, apoiado pelo então presidenciável Ciro Gomes. A decisão levou o grupo político do ex-governador Camilo Santana a lançar candidato próprio do PT, o então deputado estadual Elmano de Freitas, que veio a vencer as eleições em 1º turno com o apoio de Izolda e Cid.

Tal qual no Pernambuco da segunda década dos anos 2000, o Ceará da terceira década vive o mesmo cenário da disputa interna pelo comando das legendas, assistindo o desmonte da aliança PDT-PT e a criação de uma zona ainda cinzenta na qual novos arranjos podem unir personagens que antagonizaram as disputas nos últimos anos, criando novas frentes e alianças pragmáticas, talvez até com potencial de êxito eleitoral já em 2024 e conquista de espaços de poder.

A política é permeada de enigmas, mas a própria história, quando seriamente estudada e entendida, fornece os elementos para desvendá-los. Isso não significa que a tarefa seja fácil, pois há muita ilusão de ótica no sinuoso caminho, potencializadas por palpitarias e oba-oba de WhatsApp. É preciso está atento, pois na política, assim como no caso da esfinge de Tebas, o recado é claro: decifra-me ou te devoro.

*Isaac Luna é cientista político, advogado, consultor e professor universitário

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