Os questionamentos sobre a formação profissional dos médicos cubanos e as condições impostas pelo presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) para dar continuidade ao programa Mais Médicos no Brasil com os profissionais da ilha comunista levou o Governo cubano a encerrar sua participação no programa no país e solicitar o retorno à ilha dos cerca de 11 mil especialistas que atuam no Brasil. As condições impostas por Bolsonaro – de exigir a revalidação do diploma e contratar individualmente os profissionais cubanos – foram consideradas inaceitáveis. Em nota divulgada nesta quarta-feira, o Ministério de Saúde Pública de Cuba considerou “inaceitável” que se questione a competência e o altruísmo dos colaboradores cubanos, que atuam em 67 países atualmente. No Twitter, Bolsonaro lamentou que o governo cubano não tenha aceitado as condições.
Durante um evento em agosto deste ano, Bolsonaro já havia dito que usaria o Revalida para expulsar os médicos cubanos do Brasil. “Nós juntos temos como fazer o Brasil melhor para todos e não para grupelhos que se apoderaram do poder e há mais de 20 anos nos assaltam e cada vez mais tendo levado para um caminho que nós não queremos. Vamos botar um ponto final do Foro de São Paulo. Vamos expulsar com o Revalida os cubanos do Brasil”, declarou o presidente eleito, no aeroporto de Presidente Prudente (SP).
Condicionamos à continuidade do programa Mais Médicos a aplicação de teste de capacidade, salário integral aos profissionais cubanos, hoje maior parte destinados à ditadura, e a liberdade para trazerem suas famílias. Infelizmente, Cuba não aceitou.
— Jair M. Bolsonaro (@jairbolsonaro) 14 de novembro de 2018
O Programa Mais Médicos, implementado durante o governo da ex-presidenta Dilma Rousseff (PT) em 2013, foi um dos alvos de polarização política durante as últimas eleições. Foi implementado há cinco anos para que os profissionais cubanos ocupassem as vagas não cobertas pelos médicos brasileiros, geralmente em zonas mais isoladas e pobres. “Nesses cinco anos de trabalho, cerca de 20 mil colaboradores cubanos atenderam a 113.359.000 pacientes em mais de 3.600 municípios”, afirma a nota do Ministério de Saúde de Cuba.
Uma médica cubana que atuou por quatro anos no Mais Médicos em São Paulo conta que a notícia tem deixado os companheiros que ainda estão no programa “muito abatidos”. Sem informações oficiais de como será a transição, eles acreditam que só trabalharão mais este mês antes de retornar à Cuba. Considerada desertora depois que conseguiu o visto de residente no Brasil, a médica pediu para não ser identificada por medo de represálias do governo cubano à sua família. “O verdadeiro motivo dessa decisão é o salário. Como todos sabem, 70% do nosso salário ficava com o governo e 30% com a gente. Eu recebia em torno de 2.900 reais. Só consegui viver em São Paulo porque tinha ajuda da prefeitura com a moradia”, conta.
O programa Mais Médicos foi criticado pela classe médica brasileira desde a sua implementação. A Associação Médica Brasileira (AMB) entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal ainda em 2013, alegando que o programa promovia “o exercício ilegal da medicina” pela não exigência dos exames de revalidação de diploma pelos estrangeiros. No final do ano passado, o STF negou o pedido por 6 votos a 2.